Quando eu nasci, o famoso Deus não me disse nada. Nem olhou pra mim. São muitas as pessoas que nascem a cada segundo e eu não seria digna da visita divina - mesmo com todo o poder da onipresença. Um cara com uma prancheta colou uma etiqueta adesiva na minha testa. Anos mais tarde, puder ler "esponja" na etiqueta, com o auxílio de um espelho velho e quebrado. Velho e quebrado como eu. Eu nunca soube expressar o sentimento de "ser" uma esponja - talvez seja esse o motivo pelo qual eu recebi essa maravilhosa palavra como adjetivo. Esponja... pensemos o que uma esponja faz: ela engorda e emagrece, freqüenta lugares imundos, fica imunda, recebe duchas de água gelada seguidamente e, por vezes, é trocada por uma esponja melhor. Que merda de vida. Não sei se poderia escolher entre ser uma esponja brasileirinha, do tipo verde-e-amarela que faz a alegria das donas de casa, ou uma esponja mais especial (lilás, de banho, delicada ou com motivo infantil) - o fato é que não me mostraram outra opção. Deus mandou eu ser uma esponja e cá estou, ensaboando essa pilha de problemas. O cara da etiqueta nunca mais apareceu e eu cultivo uma certa esperança de que ele, um dia, vai colar um novo papel na minha testa. Talvez esteja na hora de uma nova pessoa ocupar meu lugar. Mas, talvez, essa demora se deva ao fato de eu estar executando bem meu trabalho ridículo. São muitas as pessoas que nascem a cada segundo e eu não continuaria sendo uma esponja se o que eu estivesse fazendo fosse tão ruim, não é? Não é? Deus deve saber o que faz. Afinal, ele é Deus - o famoso Deus: onisciente, onipresente... Maldito foi o dia em que eu peguei aquele espelho!
segunda-feira, 22 de junho de 2009
Esponja.
domingo, 21 de junho de 2009
gris.
A música começou a tocar e me deu aquela crise de nervosismo. Pra ser sincera, eu não esperava que ele fosse se levantar. Eu queria que ele deixasse aquela mesa e se aproximasse da minha, mas não achei que isso fosse acontecer tão no início da noite. O mais estranho é que, ao mesmo tempo em que eu fiquei eufórica, pensamentos superperturbadores me invadiram. Sabe, eu não queria dançar. Eu não sabia dançar. Dançaria se fosse com ele, mas, pelo mesmo motivo, eu não arriscaria colocar meus pés na pista. Se ele passasse reto por mim seria decepcionante, mas, se estendesse aquela mão bonita daquele modo clássico e brega, também seria desconfortável. Coitado, ele tinha tudo para me fazer feliz. Feliz e infeliz, porque eu nunca me dava por satisfeita.
Ele cumprimentou um conhecido dele que estava sentado quase à minha frente e então fez aquela coisa de subir a sobrancelha e fazer um aceno com a cabeça, num gesto quase imperativo que fez eu me levantar instantaneamente. A gente pegou dois copos e passou reto pelos casais que dançavam. Me disseram que nós ficávamos bonitinhos juntos e, de fato, dançando ou não éramos um belo par. Não que nós fôssemos dignos que ganhar coroas e título de rei e rainha do baile, essas coisas de filme, mas realmente nos dávamos bem. Realmente. E eu gostei de ter debruçado meus braços no parapeito da sacada e sentido um pouco daquela chuva na pele. Ele era uma boa companhia para dias e momentos cinzas. E festas, para mim, tendem a ter essa cor.
Nós ficamos conversando, conversando como pessoas que se gostavam. Isso engloba amizade e um pouco de ciúme talvez - ainda que não se note exatamente isso em uma conversa. Sempre achei engraçado que, desde o início, mantínhamos uma relação internalizada, ao contrário do que se vê por aí. E, apesar de falar muito sobre muita coisa, eu sentia que ainda teria muito por vir. Muito o que falar, o que ouvir e o que sentir. Ele era dessas "pessoas que te fazem sentir", como dizia uma propaganda de seriados da tevê. Acho que não conheço, hoje, outro exemplo para citar. Mesmo quando ficávamos em silêncio, não era de todo mal: ele me causava aquela mistura de emoções e pensamentos e, por menos próximos que fôssemos um do outro, eu sentia que naquela distância que nos separava existia uma grande razão.
Eu não sei se queria mesmo dançar ou se era só o desejo de me sentir tão bem quanto os outros pareciam se sentir. Sempre achei isso uma grande bobagem e evitei que essa preocupação tomasse grandes proporções, mas, naquele segundo, essa dúvida me incomodou. Uma música antiga atrás da outra, luzes discretamente coloridas e sorrisos bonitinhos: aquele ambiente algodão-doce nunca me parecera tão atrativo. E peguei a mesma mão bonita que não fizera o gesto de cavalheiro para mim e a segurei na altura dos meus olhos. Então, deixei que ela se acomodasse onde antes estava, pensando em como justificaria aquele gesto impulsivo. Ele passou os dedos no meu rosto carinhosamente, como fazia às vezes, e nada disse. Nós ficamos nos olhando por um tempo, até que fomos interrompidos pela risada escrota de uma garota bêbada que tinha escorregado nas lajotas molhadas.
Tanto faz, nós não ficaríamos muito tempo juntos. Ele saiu mais cedo com uns dois amigos para beber em algum lugar, mas agradeceu minha companhia. Eu também me senti grata pelas palavras trocadas e por todo aquele bem-estar. E, por mais ingênua que fosse, eu ficava alegre em saber que produzia algum bom efeito em alguém que, pra mim, era especial. Meu medo era de fazer com que ele se acostumasse a me ter sem que eu pudesse acessá-lo do mesmo modo - ou, talvez, meu medo se resumisse em não estar mais com ele. Mesmo que nós só "estivéssemos" nesse tipo de situação em que você se aproxima de alguém ímpar quando tudo a sua volta é par. Tem vezes em que é mais importante dançar, independente da companhia - mas essa parte eu não sabia fazer. Talvez ele precisasse de alguém que o estimulasse, que o fizesse se sentir como todo mundo que mantinha aquele sorriso bobo no rosto. Mais provável, porém, é pensar que ele não precisava de nada, de ninguém. E tudo o que eu tinha que fazer era fingir muito bem que eu não me importava.
sexta-feira, 12 de junho de 2009
A Espera.
Você chega no shopping, senta na mesma cadeira de sempre, apóia seus cotovelos na mesma mesa de sempre, consulta o relógio. Restam, ainda, doze minutos de espera. Você suspira, passa a mão nos cabelos, olha aflito para os lados. Pode ser que ela já tenha chegado, não? Não, você sabe que não. Logo ela, sempre tão vaidosa... nunca chegaria cedo em um encontro marcado tão às pressas.
Passam-se vinte e três minutos, vinte e quatro, uma hora. Os ponteiros insistem em te deixar ansioso. Sua intuição avisa que algo está errado. Sua tensão o confirma por si só. Você checa seu celular, procura uma mensagem ou uma chamada que não está ali – afinal, ninguém ligou. Seus olhos passeiam pelo universo à sua volta... são crianças, velhos, jovens... os mais diferentes tipos de pessoa circulam pelo lugar. Todos desnecessários: você queria apenas ela.
Seguem, então, sua expectativa e suas frustrações, que só se acumulam com o passar do tempo. Ninguém atende ao telefone, ninguém parece vir ao seu encontro. Você então se levanta, mas retorna à velha cadeira, com medo de que ela chegue justo quando você não está ali. Ou então teme que um estranho ocupe seu lugar... isso já acontecera antes, mas em outras circunstâncias, você se lembra? Sim, você relembra coisas que achava ter esquecido. E o medo invade seus pensamentos.
Impulsivamente, você caminha até a lanchonete mais próxima. Compra um refrigerante qualquer e volta a bater os dedos freneticamente na mesma mesa. Você tenta se distrair, mas a lata já está vazia sem que você tenha percebido. Sua atenção corre de pessoa para pessoa e, a cada novo andarilho que cruza seu olhar, uma nova esperança surge. Você confere o relógio uma última vez, num misto de insatisfação – tristeza - e raiva.
Você fecha os olhos por um instante, mergulhando assim numa deliciosa sensação de perda. Sim, você está sozinho agora. A ausência da moça confirmou que tudo acabou – sem nem mesmo ter a chance de se estruturar. Você empurra a lata à sua frente, que bate na mesa provocando um baque surdo. Mais uma vez você está em pé, agora decidido a ir embora. Você dá um, dois, três passos amargurados - e, no terceiro, avista-a descendo as escadas apressada. Em sua face se projeta um sorriso e, como você vê, toda a espera não foi em vão.
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Eu usava em resposta ao "quem sou eu", no Orkut, há uns dois anos atrás.
(sem título) - 28.01.2007
quinta-feira, 4 de junho de 2009
"Encontre um homem que..."
"Encontre um homem que te chame de linda em vez de gostosa.
Que te ligue de volta quando você desligar na cara dele.
Que deite embaixo das estrelas e escute as batidas do seu coração.
Que permaneça acordado só para observar você dormindo.
Encontre um homem que te beije na testa.
Que queira te mostrar para todo mundo mesmo quando você está suada.
Que te acompanhe ao cinema para ver um romance mesmo que o preferido dele seja terror.
Que segure sua mão na frente dos amigos dele.
Encontre um homem que te ache a mulher mais bonita do mundo mesmo quando você está desarrumada.
Que insista em te segurar pela cintura.
Que te abrace de surpresa na frente de todos.
Que te lembre constantemente o quanto ele se preocupa com você e o quão sortudo ele é por estar ao seu lado.
Espere um homem que com certeza está esperando por você.
Que responda as suas atitudes em relação à ele.
Que vire para os amigos e diga: É ELA, A MULHER DA MINHA VIDA."
Besteira! Quer dizer... eu não acharia tão ruim se não fosse tão alto o número de pessoas que cultiva essa idéia. Tá, isso nem importa na verdade. Só que eu acho infeliz a forma que esse textinho virou referência para algumas meninas - não só pela idéia de parecer impossível encontrar um cara como o descrito, mas pelas babaquices bregas escritas. Garanto que esse modelo de homem ideal não é satisfatório e pode ser até visto como chato pelas mocinhas que o procuram tanto (nos lugares obviamente errados, diga-se de passagem). Ok, analisando calmamente:
- Encontre um homem que te chame de linda em vez de gostosa.
Linda é linda, gostosa é gostosa. Explicação idiota, mas simples. Você pode ser linda E gostosa. Não é preciso levar um tapinha na região glútea em frente a um grande número de pessoas e ouvir exclamados palavrões, mas também não acho nada horrível dizer que alguém "é gostoso". (ok, prefiro essa falavra no gênero feminino) - Não acho ofensivo e duvido que 99,9% dessas meninas ache, até porque o fato de uma garota ser gostosa não a fará menos bonita (pelo contrário). Tá, é desnecessário discutir isso.
- Que te ligue de volta quando você desligar na cara dele.
Porra! Indelicadeza é uma maravilha, ainda mais vinda com esses típicos chiliques infantis femininos. Grosseria é grosseria, não importa a justificativa. Não quero alguém que passe a mão na minha cabeça quando eu estiver errada e se coloque em segundo plano.
- Que deite embaixo das estrelas e escute as batidas do seu coração.
Não entendi a dificuldade, mas tudo bem. Acho que essas coisinhas bregalegais tendem a acontecer mais se a gente der liberdade pra isso ocorrer naturalmente, e não como uma imposição... [?]
- Que permaneça acordado só para observar você dormindo.
Isso é meigo, mas deixa o cara. Típica cena de filme. Isso pode acontecer e você nem ficar sabendo (você estava dormindo). Tem coisas que parecem que só recebem o devido valor quando deixam de ser um segredo, não gosto disso. Eu quis dizer que eu acho bonitinho, mas não gosto da idéia de isso se tornar um "pedido". Sei lá.
- Encontre um homem que te beije na testa.
Garanto que há quem reclame!
- Que queira te mostrar para todo mundo mesmo quando você está suada.
... Sinceramente: disgusting! Cara, eu morreria de vergonha. Ficaria ainda mais "o amor é cego" (filme) a situação. Tipo tudo bem que a pessoa goste de você o tempo todo, mas ai... enfim, banho deixa todo mundo feliz e melhor.
- Que te acompanhe ao cinema para ver um romance mesmo que o preferido dele seja terror.
Tá, um cara que saiba ceder. Pronto, chega de escândalo. E acharia meio idiota se isso fosse rotina, francamente.
- Que segure sua mão na frente dos amigos dele.
Quem escreveu isso vivia nos anos 30, sei lá. Mais válido escrever "que segure sua mão mesmo quando ela está suada".
- Encontre um homem que te ache a mulher mais bonita do mundo mesmo quando você está desarrumada.
Ah, eu não gosto dessa pretensão toda. Metade das coisas da lista são para serem ouvidas e não necessariamente feitas.
- Que insista em te segurar pela cintura.
Hahaha. Esse "insista" me parece meio suspeito. Sempre imagino um sujeito chato e grudento que não deixa a guria caminhar direito.
- Que te abrace de surpresa na frente de todos.
É... também me parece suspeito. Que mania de se exibir. Não se pode ser feliz com alguém numa sala vazia?
- Que te lembre constantemente o quanto ele se preocupa com você e o quão sortudo ele é por estar ao seu lado.
"E o quão sortudo ele é por estar ao seu lado"... puxa, não se diz que se quer ouvir isso. De novo, que pretensão! Querem ouvir que são lindas, mas não podem ser gostosas... Querem que todos vejam seu poder sobre o cara (e o quão bobo ele fica na sua presença) e, agora, querem levar crédito por tudo de bom que ocorre na vida do pobre.
- Espere um homem que com certeza está esperando por você.
Com certeza, ein. Lá. Paradinho. Sentadinho, só olhando os movimentos. Numa festa, à sua espera.
- Que responda as suas atitudes em relação à ele.
Hum? Sim sim, queremos alguém que se mexa.
- Que vire para os amigos e diga: É ELA, A MULHER DA MINHA VIDA.
Eu sempre imagino a mesma situação: mesinha de bar, cerveja, um mar de amigos jovens e solteiros do sexo masculino. E um casal. Um casal, em que a namorada é uma pentelha que não deixa o cara beber em paz e/ou largar a mão dela (afinal, estão na frente dos amigos). De novo, penso que é desnecessário o exibicionismo. De novo, penso que a pretensão e o egocentrismo ultrapassam os limites. De novo, acho brega. E clichê de algum jeito - se todos dissessem isso, a afirmação perderia seu valor.
Enfim. Explicação mal-humorada sobre as razões pelos quais eu detesto a forma como esse texto foi adotado como uma religião. Já não basta a idéia do imperativo, que se choca com a espontaneidade...
terça-feira, 2 de junho de 2009
in a manner of speaking
Acho que tô "perdendo minha religião". De repente, algumas das minhas crenças antigas já não fazem mais o menor sentido. Os filmes continuam os mesmos, o tipo de música também. Os livros, tudo igual. O que mudou foi o modo como eu encaro as coisas. Quer dizer, isso não mudou exatamente: eu mudei, eu mudei. EU mudei. Mudei para um "Eu", com letra maiúscula. Continuo preferindo do outro modo, mas sei que as coisas já não são as mesmas de outrora. Eu escrevi ontem um negócio que não quis postar e tive uma conversa necessária, que me deixou reflexiva e um tanto nostálgica. O dia foi ótimo e a vida tem sido bastante brincalhona. Tenho que dormir e não vi sentido em escrever isso, senão que eu gostaria de dizer que eu posso tentar ser útil. Um tanto pretensioso isso, mas de nada custa lembrar que meus ombros ainda estão aqui - se o que eu disser não ajudar, pelo menos os ouvidos não vão falhar em escutar, eu espero. Apesar de falar merda, não estou no meu momento descontraído. Gosto de ficar quieta, às vezes, bem quieta. E sei que sou mal interpretada por isso. Mas também não me vejo na obrigação de me explicar. Estou amadurecendo idéias, me frustrando com algumas notícias e ficando feliz por outras. A gente sempre pensa que mudou para algo melhor. É o que deveria ser mesmo. Eu fico triste em ver pessoas que já estiveram mais presentes na minha vida enfrentando situações difíceis - espero que tudo se resolva. Gostaria, sinceramente, que esse frio continuasse assim. Acho que é só o que eu posso desejar - porque o resto muda, sempre muda. Não posso nem quero exigir mais de ninguém. Como eu disse, tô "perdendo minha religião". Cansei de me encantar com respostas mágicas. Quero o que é concreto, o que é palpável - qualquer coisa que faça sentido o tempo todo, independente das mudanças na minha personalidade ou no mundo que é externo a mim. Acho que adquiri essa insegurança das coisas, essa necessidade de me basear em verdades consolidadas e não exatamente nos meus conceitos passageiros. Quando tudo parece estar bem, eu entro nesses momentos cinza-masoquistas e nada me tira deles. Exagero: nada que uma boa música e uma boa companhia não sejam capazes de interomper. Só não quero me viciar, me viciar e me frustrar. Não é o que eu acho que esteja acontecendo ou o que eu imagino que faça parte do futuro próximo, mas tenho receio disso. Eu sou uma pessoa substituta. Nada me fez pensar o contrário - talvez sentir, mas sentimentos são efêmeros.